Sobre os incentivos da geração própria de energia, Cláudio Dantas, da JP News, entrevistou e intermediou um debate sobre a conta de luz, cada vez mais alta, subsídios do setor e essa relação entre oferta e demanda.
Mas, antes, é preciso entender que houve um tempo em que o Brasil sofria de apagões por falta de geração de energia. Com a matriz hidrelétrica dependente das chuvas, cada vez mais escassas, o governo sempre recorreu ao acionamento das térmicas a carvão. Essas, além de poluir o ambiente, pesam muito no bolso do consumidor. Alguns até tentaram baixar os preços na “marra”, mas, a conta sempre chega mais tarde.
Esse tempo de escassez parece ter ficado para trás, uma vez que o Brasil se abriu às novas fontes de energia renovável, investiu pesado em parques eólicos e solares e conseguiu produzir energia de sobra, que agora contam com incentivos da geração própria.
Veja a íntregra da entrevista
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Incentivos da geração própria de energia – relatório do operador nacional do sistema
Segundo relatório do operador nacional do sistema, as fontes de energia renovável foram responsáveis pela produção de 38 GW no ano passado. E, em 2027, deve produzir mais de 100 GW, cerca de 90% de toda a demanda nacional. Na prática, em três anos teremos uma oferta disponível de 281 GW, considerando todas as fontes de energia. Será um excedente inédito no mundo, o que daria para abastecer quase toda a América Latina. Por isso, temos de debater os incentivos da geração própria de energia.
Essa super oferta deveria, é claro, significar uma queda brusca na conta do consumidor final, mas não é isso o que está acontecendo. Dias atrás, o presidente da ANEEL estimou um aumento médio de 5,6% nas contas de energia em 2024, ou seja, um valor bem acima da expectativa da inflação.
No ano passado, isso também aconteceu e tudo indica que continuará ocorrendo. O sistema elétrico brasileiro é regido por regras anacrônicas, que já não equacionam geração e distribuição da atual matriz energética.
Os subsídios se avolumam sem explicação e a renovação de concessões é feita sem debate público. A omissão das autoridades torna o cenário ainda mais desafiador, ou seja, um verdadeiro curto-circuito, que requer uma revisão nos incentivos da geração própria de energia.
E, para debater o tema, a conversa foi com o presidente da Associação Brasileira de Distribuidor de Energia Elétrica, Marcos Madureira, e o presidente do Instituto Nacional de Energia Limpa (INEL), Heber Galace.
Durante o debate, diante do que foi introduzido, Madureira se pronunciou dizendo que “nós temos uma equação que não está fechando. De fato, estamos em um momento em que o país desenvolve uma série de fontes de energia, principalmente as renováveis, com preços cada vez menores. Mas, por que a conta de energia elétrica, no final, está subindo tanto?
Existem algumas razões para isso. A primeira delas é a necessidade de separar as responsabilidades pelo pagamento das despesas que são colocadas nos custos de energia no Brasil. Temos o mercado regulado, onde as distribuidoras entregam energia diretamente aos consumidores. E, essa energia vem principalmente de leilões públicos, de onde é adquirida a energia colocada nesses leilões. E o que define isso, é a necessidade do sistema.
Por isso, em alguns momentos as distribuidoras podem comprar, em um leilão, uma quantidade muito maior de energia das térmicas com um preço mais elevado, mas que são necessárias para o suporte do sistema. Que a energia, por exemplo, de origem eólica ou solar que tem preços menores, e nós começamos por aí a ter esse desequilíbrio.
Incentivos da geração própria – segunda questão
O segundo ponto é que muitas dessas ações que têm sido colocadas para incentivar consumidores do mercado de energia ou algumas fontes de energia trazem subsídios. Assim, para que eles possam ter seu negócio é dado a eles ou um preço menor para que eles paguem pela energia elétrica (consumidor). Ou, ainda, um desconto que é dado para alguma fonte de energia para que ela possa deixar de pagar uma parcela do uso do sistema elétrico.
Tudo isso termina encarecendo a conta final do consumidor. Então, hoje o que nós temos é uma energia que está ficando mais barata. Isso, do ponto de vista de algumas fontes, mas o resultado do preço da energia é maior para os consumidores.
O tema é complexo. Essas novas fontes de energia renovável geram um debate Global sobre mudança de matriz energética de combustíveis fósseis para combustíveis renováveis. E, há todo um incentivo do estado garantindo através, justamente, de isenções tributárias etc.
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Segundo diz Heber Galarce, presidente do Instituto Nacional de Energia Limpa (INEL), a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (ABRADEE), tem uma queixa frequente sobre subsídios e sobre um modelo que está ficando insustentável.
Ele comenta que isso vai gerar um grande impacto e para as pessoas do mercado regulado, comprar um equipamento de microgeração para o seu telhado e gerar sua energia. Assim você deixa o ambiente regulado e as distribuidoras reclamam que isso gera uma conta para outros etc.
“Mas por que eu comecei a dar essa introdução? Entendendo a queixa do presidente da ABRADEE, Madureira, mas nós estamos num momento excelente do modelo de concessões das distribuidoras de energia elétrica. Ele foi desenhado há quase 30 anos e não se mexeu mais nele.
Então, não tem momento melhor, agora que estão vencendo as concessões, para a gente tranquilizar, pacificar e a discutir isso com calma, sobre quais seriam os ajustes.”
Excesso de subsídios
De acordo com Madureira, o atual modelo é o que vem dando resultado. Ele tem sido o único elemento onde se reduz custos. “Nós temos dados da própria ANEEL que mostram que é o único em que os preços têm se reajustado abaixo da inflação.”
Isso, porque uma parcela do ganho de eficiência que as distribuidoras têm vai para a modicidade tarifária. Agora, o que nós temos, sem dúvida nenhuma, é o aumento do custo pelos subsídios. “Então, se eu tenho um investimento e esse investimento recebe um excesso de subsídio, pesa para o consumidor.”
O consumidor está pagando uma conta mais alta porque alguém está tendo uma rentabilidade maior sobre esse serviço. É hora de se olhar para isso, sim. Mas, nós precisamos dos investimentos de transmissão. Investimentos de distribuição são necessários para permitir que o sistema funcione. Se alguém não paga uma parcela desse valor os demais estão pagando por isso. Isso é o que nós temos hoje no Brasil.
Projeções de excedente
Segundo dados de um relatório oficial, feito pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico, há uma projeção de que em 2027 teremos um excedente de 100 GW no sistema. Então, teremos uma oferta de 281 GW para suprir uma demanda de 108 GW. Assim, teremos um pouco mais de 90 GW de energia disponível.
Isso é muito curioso. Há poucos anos, estávamos sofrendo com apagões; com falta de energia disponível. Tivemos em diversas ocasiões, o acionamento das térmicas, uma energia muito mais cara e poluente. E o poder público reagiu de diferentes maneiras sempre com planos de urgência.
Questionado se é importante incentivar um setor novo, como o de energia renovável, mas parece ter faltado planejamento para que o sistema pudesse receber essa oferta.
De acordo com Madureira, não existe mais um planejamento de energia como se fazia no passado. Isso é fruto das evoluções que passamos, inclusive, de abertura de mercado, que são necessárias.
A partir dessa da demanda que era apresentada pelas distribuidoras, havia uma projeção de quanto de energia seria necessário ofertar. Então, você tinha um casamento entre oferta e demanda para construir uma quantidade de usina suficiente para atender uma demanda. Então, essa balança tem que estar equilibrada.
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Mas, hoje a oferta não está necessariamente junto com a demanda. Por exemplo, se eu tenho um consumidor que migra do mercado regulado para o Mercado Livre, ou uma parcela do seu consumo deixa de ser consumido no mercado regulado e vai para uma geração distribuída, essa energia sobra naqueles contratos que foram feitos.
Isso resulta em uma sobra de energia. Não existe mais um planejamento para poder efetuar. Existe uma quantidade grande de construção de novas usinas que, não necessariamente, acompanha o crescimento do mercado.
Daí acontece essa sobra que, a princípio, produziria uma redução do preço final da energia. Mas, não é isso que se verifica porque algumas fontes não pagam, por exemplo, pelo uso de transmissão, da distribuição, itens esses que aumentam o valor da conta de energia elétrica.
Então hoje nós estamos tendo um descontrole entre essas duas questões. Não é a questão de ter um planejamento exato, porque no mercado aberto isso não acontece. Mas, precisamos ter preços mais realistas para que o mercado possa evoluir de forma adequada.
Foi levantado o questionamento sobre queixas de que esses subsídios para as energias renováveis acabam beneficiando quem tem mais recursos financeiros. E, que isso pesa para os consumidores mais pobres. Dessa forma, o governo entra e cria o subsídio para os menos favorecidos para que eles tenham acesso à energia mais barata. Então, é subsídio sobre subsídio, que acaba prejudicando essa conta final.
Nesse ponto, Heber Ganarce cita o Agro como exemplo, já que o protagonismo do Brasil nesse setor é imenso. O INEL tem a missão de desenvolver energia limpa e barata para todo mundo e, se possível, que a energia seja um eixo de desenvolvimento econômico do país.
O Agro precisa competir e não dispõe de oferta de energia onde poderia ampliar a produção de alimentos. Em 2022, de acordo com a CNA e a USP, junto com a cadeia de transporte, distribuição, comercialização e produção de alimentos, o Agro respondeu por 24% do PIB.
Em determinadas regiões é necessário ter uma oferta de energia que nem sempre é possível. O INEL, então, levanta a questão de qual tipo de energia poderia ser considerada.
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Geração distribuída gera energia com recursos próprios
Segundo Ganarce, “a ABRADEE, como instituição que representa as distribuidoras diz que a geração distribuída penaliza os demais. Mas, o que é a geração distribuída no final do dia? É um cidadão que, com seu próprio recurso, com seu próprio financiamento, cansado das altas históricas de energia, adquire seu próprio equipamento para gerar energia.”
“E o que está acontecendo hoje é uma guerra de atributos, você fala assim: não, ele faz a energia própria, ele vira um problema para quem não faz. Mas, quem faz a energia própria, primeiramente usa seus próprios recursos e alivia a pressão na rede.”
“Essa energia que ele produz, inclusive, ela é limpa e, se você olhar de uma maneira geral, você está gerando energia limpa solar e, obviamente, questionando a necessidade ou tamanho de contratação de térmicas, por exemplo.”
“É preciso discutir os incentivos da geração própria de energia, diz o presidente do INEL: Então, vamos fazer uma proposta? Vamos tentar discutir todos os subsídios ou incentivos dentro do setor de energia elétrica? É só uma proposta razoável, mas não penalizar individualmente alguém por uma determinada escolha ou opinião, eu acho que é razoável.”
Mas, o que o setor de distribuição pode sugerir para tentar chegar a um consenso?
Em primeiro lugar é preciso entender por que a ABRADEE está dentro dessa questão. De acordo com Madureira, esse é o único segmento que, historicamente, reajustou seus valores abaixo da inflação. Apenas para demonstrar, hoje, uma conta de luz de R$ 100 por exemplo, tem algo em torno de 35% só de tributos e encargos. São dados fornecidos pela agência reguladora.
O único item que reajusta menos que o IPCA é a distribuição. Isso porque é compartilhado com o consumidor os ganhos de eficiência. Quanto aos valores da transmissão, às vezes, são reajustados abaixo do IPCA, mas começou a apontar um crescimento acima do indicador (IPCA).
Isso ocorre devido a uma série de investimentos para possibilitar mais investimento nas renováveis, principalmente no Nordeste. Mas, o questionamento não é apenas sobre um item da tarifa de subsídio, e sim, sobre todos. É preciso rever todos.
Quanto ao Agronegócio, Madureira entende que se trata de um dos elementos importantes para a economia brasileira. E, tem sido um dos carros chefes da economia no Brasil.
O questionamento que se faz em relação ao ponto específico da utilização e de usinas de geração é o seguinte exemplo: se constrói uma usina numa propriedade que está numa determinada região, se utiliza um sistema de transmissão e distribuição para levar essa energia às vezes por 1000 km de distância sem pagar pelo uso desse sistema.
Quem paga a conta?
O sistema existe e o custo dele permanece e precisa ser coberto. Quando esse custo não é coberto por algum consumidor ele termina sendo pago pelos outros consumidores. Isso não acontece apenas com a geração distribuída. Ele ocorre quando há um desconto para uma outra fonte que paga menos para ser utilizado.
E o encargo, o CDE, termina não sendo pago por todos os consumidores. Por exemplo, consumidores de geração distribuída não recolhem a CDE e, assim, a energia fica mais cara para os demais consumidores. A ABRADEE não questiona nenhuma fonte de energia. Todas elas são necessárias e importantes. O questionamento é sobre o quanto uma fonte está deixando de custo aos consumidores.
Quem entrega a conta e é questionado sobre a tarifa mais elevada é a distribuidora. Por isso, a nossa preocupação não é com uma fonte, mas com todas. No final do ano, o PL 11.247 trouxe uma série de emendas adicionais ao que era o PL de energia offshore. E, não temos nada contra a instalação de eólica offshore no Brasil, mas a quantidade de questões que vieram sobre todas as fontes é absurda.
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Cláudio Dantas, acrescenta que os próprios parlamentares reagem às pressões dos setores para impor a compra dessa energia, muitas vezes, das fontes mais caras, gerando um custo maior para todo mundo.
Madureira completa, dizendo que é muito importante ter fonte de energia eólica e solar, que são mais baratas. Mas, há necessidade de manter fontes como a hídrica, que mantém todo o equilíbrio e as térmicas também. Assim, se alguém que paga apenas para usar uma fonte mais barata, mas, no fundo, usa a mesma energia que os demais, esses estão pagando mais caro.
A ABRADEE, segundo Madureira, não é contra nenhuma fonte de energia elétrica nem nenhuma tecnologia. Somos contrários sim, a todos os subsídios. É claro que a tarifa social é importante em um país com desigualdade de renda muito grande. Mas, os demais subsídios da conta de energia devem ser todos revistos.
A discussão é complexa e tende a ser acalorada, enquanto houver discrepâncias. Mas, a única certeza que podemos ter no momento é que a energia solar é fundamental. É uma fonte limpa, renovável e sustentável, que você também pode adotar. Seja solar!
Você sabia que o mercado oferece linhas de financiamento específicas para a adesão às energias renováveis? Alguns exemplos de instituições são o Santander e a Sol Agora, que oferece financiamento inteligente e totalmente digital.
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